O AVANÇO DO PROGRESSISMO NA IGREJA NOS ANOS 60-70. Artigo 4.

Valter de Oliveira

Uma Nova Moral?

A Igreja-Nova dos progressistas não se considera Mestra da Verdade e da Moral. A atitude de ensino é oposta à dignidade do povo evoluído de hoje, em que cada um pensa por sua cabeça. Cada homem pode ter uma fé e uma moral modeladas essencialmente por sua consciência livre. Tudo é, pois, subjetivo e relativo e os princípios da Igreja devem ser adaptados aos homens e aos tempos. Baseados nesse princípio evolucionista (tido como verdade absoluta e imutável…) os arautos do progressismo vão destruindo toda a moral católica, aceitando e desenvolvendo erros defendidos por Lutero e reformadores e pelas ideologias contemporâneas.

Quadros Comparativos

Vejamos isso em alguns pontos. (1)

Divórcio e amor livre

  Conforme Lutero   – “No “Cativeiro de Babilônia” (1520), (Lutero) admite já a possibilidade de divórcio; no “Sermão do Casamento”, ele desce a precisões: enumera 3 casos de divórcio: a impotência, o adultério, a recusa do dever conjugal”. (DTC cols. 1279, 1280). (2). -Em 1523, o “reformador” ajuntou dois outros casos de divórcio: a diversidade de religião e     o mau caráter de um dos cônjuges” (DTC col. 1281) (3).   – Mais tarde Lutero admitirá praticamente o amor livre, porque afirmará que o casamento pode ser dissolvido com o simples consentimento de um dos cônjuges (DTC col. 1282). Era natural que chegasse a este grau de leniência moral quem considerava o matrimônio – “um ato exterior físico, do gênero das outras ocupações ordinárias”. (DTC col. 1283-Lutero).  Progressismo     – No recente plebiscito sobre o divórcio realizado na Itália, o apoio progressista ao divórcio foi público e notório.   – “Independentemente do reconhecimento do seu segundo casamento pelo direito eclesiástico, é vivamente desejável que os     divorciados recasados, que com toda a sinceridade (sic!) querem viver cristãmente (sic!), possam ter acesso à Eucaristia”.   – “O essencial é amar e ordenar o casamento ao amor. A moral conjugal não tem sentido para um casal que se ama verdadeiramente (…) O pecado é não amar”. (ICI, nº 319, pg 23 Cfr. Catolicismo nº 221).    
Da crise para a felicidade

Na linguagem progressista – seria melhor dizer revolucionária – as palavras são sempre ambíguas. Nos textos acima o que quer dizer “sinceridade”, “cristamente”, “amor”? Parece que, para eles, sincero é o homem espontâneo, que dá largas à sensação, à fantasia, evitando toda forma de esforço, toda ascese, toda coibição. Se ele tem vontade de fazer algo, faz, não importa se está certo ou errado. E o faz claramente. Por isso é sincero!… Para ser cristão, por sua vez, basta ter uma tal ou qual simpatia por Nosso Senhor. Daí chegamos ao absurdo de afirmar que uma pessoa vive cristãmente mesmo tenha uma vida que vai contra os ensinamentos do próprio Verbo Encarnado.

“A moral conjugal não tem sentido para um casal que se ame verdadeiramente” … Ou seja, onde há “amor”, não é necessária a moral! Lembra as críticas de Moisés contra a Lei, contra os mandamentos. Na prática isso leva à adoção do amor livre pregado pelo marxismo.

Em 1969, a revista soviética “Agitador” publicou um artigo sobre a doutrina comunista em matéria sexual. Ela também afirma que “o essencial é amar” … “Na sociedade comunista, (…) não se consideram imorais as relações sexuais antes do casamento, quando se baseiam na sinceridade e no afeto”. E ainda: “existe um novo critério moral para condenar ou reprovar o sexo. Não se trata de situar as relações (sexuais) como matrimoniais ou pré-matrimoniais, mas sim em estabelecer se se baseiam no amor recíproco”.

Ora, basta abrir os olhos em torno de nós para ver quantas vezes é instável esse “amor recíproco”. “L’amour est um enfant de Bohême, qui n’a jamais connu de loi”. (O amor é filho da Boemia que jamais conheceu a lei). Qualquer pessoa que ainda tenha um pingo de bom senso sabe perfeitamente que hoje em dia “amor” é sinônimo de prazer. Aliás, o “Agitador” mostra claramente isso ao citar uma frase de Lenine: “O comunismo não deve levar ao ascetismo, mas sim ao gozo da vida”.

“O ‘amor’ pregado pela Revolução é o amor por si mesmo como centro de tudo, é o mais requintado egoísmo. Não tem nada de comum com o amor cristão  em que procuramos o bem de nosso próximo, sobretudo os bens espirituais. Este é o amor que exige dedicação, ascese, generosidade, paciência, holocausto, pois como nos diz o Evangelho, “não existe maior prova de amor do que dar a vida por aqueles que se ama”.

É de se espantar então, se baseados na “compreensão” e na “caridade” os franciscanos de Petrópolis, através da revista Vozes, aconselhem ao homossexual a ser “fiel” ao seu companheiro?

A isso nos levou a “Nova Moral”. Hoje aceita-se o divórcio, o amor livre, o aborto, os mais diversos desvios sexuais com a maior naturalidade, procurando  justificar tudo com o Evangelho! (…)

A exacerbação das ideias de Lutero, conforme muitos autores, levaram ao Anabatismo, que tinha uma visão social igualitária e, na linha dos costumes, acabou por reintroduzir a poligamia  tal como no Antigo testamento. João de Leyde, um dos líderes, chegou a ter 16 mulheres! Verdade que Lutero não os considerou como seguidores do caminho que abriu, pelo contrário, aceitou a feroz cruzada dos príncipes alemães contra eles. O castigo foi duro. Foram exterminados. De qualquer modo  cumpre notar que os derrotados extremistas do século XVI tiveram muitos dos seus ideais implantados no século XX.

 O que ficará de pé?

Não foi apenas no campo moral que o progressismo realizou na prática a obra destruidora da Reforma. Os protestantes negaram Nossa Senhora, o culto dos santos, os anjos, o purgatório. Para eles somente importava Jesus Cristo. A negação de intercessores combina, de acordo com vários comentadores, com a soberba reformista. (….).

Hoje, nas fileiras católicas, a devoção à Nossa Senhora está morrendo. Suas imagens vão sendo retiradas, seu escapulário desprezado e esquecido, e contra o terço o combate é sem tréguas. Há catecismos modernos que ensinam ou colocam em dúvida que não há mais anjos nem demônios, nem Céu, nem inferno, nem purgatório. Há apenas uma nova religião, a religião do homem.

Ao progressismo atual podemos aplicar as mesmas palavras de São Pio X a respeito dos modernistas: “coisa alguma poupam da verdade católica, nenhuma verdade há que não intentem contaminar” (Pascendi, pg. 4). O que, pois, ficará de pé?

(…)

Progressismo e protestantismo são duas heresias que diferem em certos pontos, mas que têm vários pontos comuns. Assim sendo, é natural simpatias recíprocas entre seus membros. O que não implica em afirmar que não haja também sérias discordâncias entre eles. Aqui, de momento, estamos mostrando apenas as simpatias.

Em 30 de outubro de 1967, D. José de Castro Pinto publicou no “Jornal do Brasil” um artigo sobre o protestantismo e o ecumenismo. Nele o prelado admite que “muitos dos valores espirituais” do cristianismo “possam ter-se desenvolvido “melhor” na seita fundada pelo frade apóstata Martinho Lutero do que no grêmio bendito da Santa Igreja Católica, fundada por Jesus Cristo. E depois: “Se em muitas coisas a mensagem evangélica está lidimamente conservada na Igreja Católica, inclusive o conjunto da mensagem, muitas coisas foram melhor difundidas e conservadas fora” (5).

Há mais.

A “Última Hora” de Belo Horizonte, no dia 6/12/67, publicou a seguinte nota:

“O arcebispo de Recife, Padre Helder Câmara, será o paraninfo da turma de pastores do centenário da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista do Brasil, cujos 21 integrantes o elegeram por unanimidade, para expressar o verdadeiro ecumenismo e “a perfeita identificação dos protestantes com os católicos na nova maneira de encarar a missão social dos religiosos”.

No dia da cerimônia D. Helder iniciou sua oração com as seguintes palavras:

“Bendito seja Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, Pai de Misericórdia e Deus de toda consolação. Bendito seja, pela alegria desta noite, impensável para Vós e para nós, anos atrás”.

O arcebispo finalizou seu discurso dizendo:

Dom Helder Câmara

“Se Deus permitisse que Lutero nos aparecesse agora e nos falasse, certamente nos diria que para ser digna de Cristo, para viver a responsabilidade a Igreja precisa não apenas de uma Reforma, realizada de uma vez e para sempre, mas de uma reforma permanente, de todos os dias, todas as horas e todos os instantes.” (D. Helder: tentemos o diálogo. OESP 12/12/67.)

Realmente uma afirmação destas era realmente impensável anos atrás…

Notas atuais.

  1. Frase que foi inserida agora. Não constava no texto original.
  2. Conforme a moral católica nunca pode haver o que se convencionou chamar de divórcio, tal como foi estabelecido em inúmeros países. No passado se dizia que um católico poderia se desquitar, ou seja, por razão grave poderia separar-se de seu cônjuge sem o direito de contrair novas núpcias.O que sempre houve na Igreja foi a declaração de nulidade do matrimônio. Por exemplo, se houvesse um erro essencial de pessoa, afirmava-se que não houve o matrimônio. Havia também outras causas. Com o novo Direito Canônico houve ampliação dos casos em que o casamento pode ser declarado nulo. Se isso acontecer pelo menos um dos cônjuges pode voltar a se casar na Igreja. Tema para outro artigo.
  3. A diversidade de religião não impede o casamento e, a não ser excepcionalmente, pode ser causa de nulidade.
  4. Talvez seja útil um estudo comparativo entre as várias igrejas oriundas da eclosão de Reforma, incluindo as mais radicais.
  5. Um católico crê que toda a mensagem evangélica está na Igreja, não “muitas”. Outro ponto: Não é contra a doutrina católica quem afirma o que disse o prelado quanto a algum ponto particular no qual os protestantes se destacaram. O estudo da Sagrada escritura, por exemplo, pelo conjunto dos fiéis.
  6. Se fosse hoje diria que as palavras de D. Helder foram ambíguas, coisa habitual no progressismo. Na época D. Helder era tido como o arcebispo vermelho e fazia parte de um grupo que abriu o caminho para a Teologia da Libertação. Muitas de suas frases ditas na época, tanto sobre a Reforma da Igreja quanto sobre temas sociais e políticos, causavam escândalo. Cito, como exemplo, sua defesa da violência revolucionária contra o sistema, tido como o primeiro agressor.  Podemos achar que a Igreja precisa de Reforma ainda hoje, afinal, a chamada Igreja militante pode apresentar muitas misérias. A questão é achar que é Lutero quem pode nos orientar neste ponto. Há inúmeros santos, mesmo do tempo da Reforma, que teriam muito mais a ensinar sobre isso.
  7. Relendo hoje o que escrevi há 50 anos vejo que muita coisa seria dita de outro modo. São 50 anos de novas leituras e observações. Também de novas orientações da Igreja para a abordagem do tema, especialmente na linha do diálogo ecumênico. Diálogo que aceito com toda alma, mas que, devido a vários desvirtuamentos, precisa ser muito bem explicado e entendido.

Obs. Em breve iniciarei a série sobre o progressismo atual. Análises, críticas aos 4 artigos, serão muito bem vindas. De preferência no próprio site.  

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